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O QUE PENSA O INDIVÍDUO MARGINAL PERIFÉRICO?
A principal ideia da
religião é aproximar o homem de Deus. No dicionário Aurélio é apresentada como:
"Crença na existência de forças sobrenaturais; ou manifestação de tal
crença pela doutrina ou ritual próprio, devoção". A religião é o exercício
que visa aproximar o homem ao sobrenatural. Uns creem que essa dimensão
sobrenatural são apenas forças cósmicas que estão em tudo, em toda a matéria, e
a prática religiosa consiste em absorver parte dessa energia contida no âmago
da matéria. Outros creem que existem várias divindades, e para nos aproximarmos
das tais, devemos oferecer-lhes atributos para agradá-las e, consequentemente,
aplacar sua ira.
Mas a ideia
mais difundida da religião e o seu sentido, para a maioria das pessoas
periféricas do Brasil, é que existe um ser superior a quem chamamos de Deus e o
culto devocional a esse ser com louvores, adoração, gratidão (ação de graça) e
petições é o verdadeiro significado da religião em si; ou seja, no senso-comum,
é a adoração a um Deus superior a tudo e a todos, conhecido por sua grandeza,
mas a par das formalidades e até mesmo pela sua superioridade reverenciada,
está distante de todos; e que responde as petições de alguns de acordo com sua
inquestionável disposição e vontade.
Essa
ideia concebida pelo marginal periférico, em sua maioria, do que é religião,
cai em contradição com o seu principal baluarte de fé. Esse aglomerado de
pessoas que elegem Deus como o ícone de sua religião, os chamados cristãos, tem
como base para sua fé a Bíblia, o seu livro sagrado. A Bíblia,no que se refere à religião e o seu
sentido, destoa da massa periférica e deixa um texto bíblico para exemplificar
a discrepância entre a forma atual de como é interpretada a religião e a forma
que a Bíblia ensina.
Tiago
1.26,27 –(v.26) “Se alguém entre vós
cuida ser religioso e não refreia a sua língua, antes, engana o seu coração, a
religião desse é vã”;
(v.27) – “A religião pura e
imaculada para com Deus, o Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas em suas tribulações
e guardar-se da corrupção do mundo”.
O
que fica claro nesse texto é que a religião, longe de ser apenas uma vaga exaltação
a Deus com palavras, rezas ou orações vazias e formalizadas como avistamos hoje
nas igrejas e nos tele cultos, a verdadeira religião é observar-se a si mesmo, é
preocupar-se em conhecer as estruturas que permeiam nossa subjetividade, e,
depois desse exame reparador, agir, não em prol das minhas aspirações pessoais,
mas transformar as necessidades do próximo em alvo para a minha ação; a
verdadeira religião para o Deus da Bíblia é quando um ser se satisfaz com a
realização de outro indivíduo. A verdadeira religião segundo as Sagradas Escrituras
é amar a Deus e ao próximo como a nós mesmos; essa prática de amor vale muito
mais do que holocaustos e sacrifícios (Mc 12.28 e 34).
Mas
a religião praticada perifericamente está longe de ser fundamentada no amor,
pois o que é praticado hoje, tanto nos templos cristãos como em outras formas
de cultos, é o sacrifício como elemento principal para agradar e entrar em contato com Deus, ou
seja lá qual for a divindade, a abstenção como forma de purificação para
absorver alguma forma de virtude ou energia sobrenatural, e ações legalistas e
enrijecidas para alcançar uma espécie de
santificação; eis a lógica da religião periférica. E, portanto, nessas ideias
concebidas e comentadas, é desprezada a verdadeira forma da religião e como
através dessas atividades chegaremos à santificação e consequentemente à
comunhão com Deus.
A
santificação, diferente do que pensa a maioria, não está na forma visível e não
começa com atitudes legalistas. Ela começa com uma observância interior em
nossa própria vida. O que quero? O que é Deus para mim? Desejo realmente
abençoar meu próximo? Qual é o real valor da religião que pratico? Será que tem
valor? Realmente acredito no que declaro acreditar?
A
partir desses questionamentos, chegando à conclusão se acreditamos ou não no
que confessamos, se a resposta for negativa, deveremos procurar a lógica de
tudo isso, se for positiva a primeira atitude deverá ser a de nos ajustarmos aos preceitos
que permeiam a crença que confesso acreditar.
Entendo que a religião, antes de ser social, deve ser individual, antes de fazer parte de
uma corporação devo entender que sou um membro, um cidadão enquadrado em um meio
e que preciso saber quem sou para depois entender o que fazer. Devo conhecer e
entender com propriedade o alvo do meu culto, devo, nesse culto, derramar
individualmente meus questionamentos, medos, dúvidas, a fim de que nessa
prática intimista – eu, “ser individual”, possa conhecer melhor o Deus da minha
fé, para depois, como comunidade, poder passar a ensinar para o próximo o que
aprendi no exercício individual da busca de Deus e de suas respostas.
O
indivíduo, antes de ser um integrante de uma determinada religião, é alguém em
sua subjetividade que precisa crescer, conhecer-se, para depois, em sua
maturidade, agir ou determinar uma função específica para si.
A
ideia estabelecida hoje é a ideia de grupos onde nesse meio o indivíduo perde
sua individualidade para ajustar-se à massa. Essa é a ideia marginal periférica
mais difundida do que é religião.
Religião,
ao contrário desse pensamento, não é uma comunidade que busca e adora um deus;
religião verdadeira são indivíduos que, em suas buscas, encontram Deus, que por
si mesmo se oferece e permite-se ser achado, portanto, entendendo os preceitos
divinos se ajuntam para compartilharem a descoberta e a graça alcançada por
esse Deus tão almejado. A partir dessa certeza, de se ter encontrado Deus, “individualmente”,
os cidadãos se ajuntam em comunidades (ou seja: reunidos, mas cada um em sua
subjetividade) para com isso se ajustar uns aos outros na forma ideal de seguir
a esse Deus.
“Existe o perigo de que os verdadeiros
cristãos, que sabem que o cristianismo não é um assunto meramente particular,
reajam contra o erro, transpondo nossa vida espiritual o mesmo coletivismo que já
conquistou nossa vida secular.” (C. S. Lewis).
Por
Lailson Castanha
OBS.: A filosofia marginal periférica, é o modo como a comunidade da periferia, que está a margem do saber escolástico, entende certas questões comuns da vida, como por exemplo, "o que é a religião".
(Extraído
da apostila do autor do texto - “Filosofia Marginal Periférica – Ensaio sobre
a filosofia marginal”. Observação:
O autor é graduado em filosofia).